sexta-feira, 31 de agosto de 2012

O Sonambulismo face a Doutrina Espírita


Por Maria das Graças Cabral

Muito comumente, ouvem-se relatos de pessoas que durante o sono falam e andam de olhos abertos, contudo inconscientes. O fenômeno é considerado pela medicina como uma doença denominada de “sonambulismo” ou “parassonia.” Caracteriza-se pela alteração de comportamento durante o sono, cuja causa ainda é um mistério para os especialistas. Por enquanto. as respostas eficientes restringem-se aos tratamentos disponíveis para o problema com uso de medicação nos casos mais graves, que põem em risco a segurança do paciente. 

Por outro lado, propaga-se uma ciência denominada de “projeciologia (do latim projectio significa projeção e logos no grego significa tratado) que é o ramo, subcampo, ou especialidade de caráter mais prático da conscienciologia, e da psicobiofísica (versão mais abrangente da parapsicologia) que estuda as projeções energéticas da consciência e as projeções da própria consciência para fora do corpo humano, ou seja, das ações da consciência operando fora do estado de restrição física do cérebro e todo o corpo biológico. Devido à falta de evidência científica e experimentos em condições controladas, à ausência de hipóteses e previsões que possam ser submetidas a teste ou ser falsificadas com o método científico, a projeciologia (assim como os outros ramos da denominada parapsicologia) é considerada uma pseudociência.” (Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Projeciologia)

Observa-se portanto, o desenvolvimento de várias frentes de pesquisa por parte da ciência médica, como também por parte da parapsicologia, no intuito de compreender e esclarecer com eficiência o fenômeno sonambúlico. Na realidade, o sonambulismo é vivenciado por pessoas das mais diversas faixas etárias, graus de instrução, crentes ou não crentes, das mais diversas localidades do mundo, chamando atenção e provocando a curiosidade de estudiosos e leigos.

Diante do exposto, o presente artigo tem por objetivo desenvolver algumas breves considerações sobre o assunto, à luz da Doutrina Espírita. Para tanto, faz-se por oportuno inicialmente a apresentação de algumas experiências sonambúlicas divulgadas:

(I) “O artista plástico britânico Lee Hadwin, que só consegue desenhar enquanto está dormindo, lançou uma exposição de suas obras em Londres. Hadwin foi descrito pelos especialistas da Clínica do Sono de Edimburgo, na Escócia, como um caso único. Ele foi diagnosticado com sonambulismo e conta que não se lembra de absolutamente nada do que produz de madrugada. Hadwin nunca fez cursos de artes e afirma que nunca teve muito interesse por estas atividades. No entanto, enquanto dorme, ele desenha retratos, paisagens e figuras abstratas. Ele começou a desenhar durante o sono quando tinha 4 anos de idade, deixando suas marcas em paredes ou qualquer pedaço de papel que estivesse ao alcance. Atualmente, Hadwin se prepara melhor e deixa seus cadernos de desenho e materiais espalhados pelo apartamento onde vive e vem aperfeiçoando seus trabalhos nos últimos anos.” (Fonte: http://noticias.r7.com/internacional/noticias

(II) “Numa madrugada há pouco mais de 20 anos, o médico urologista carioca Luiz Otávio Zahar teve a sensação de acordar no meio da academia de ginástica que costumava freqüentar. As luzes estavam apagadas e não havia ninguém usando os aparelhos de musculação nem circulando pelos corredores. O médico percorreu o espaço de um lado para o outro, sentindo-se absolutamente consciente. Mas seu passeio noturno, segundo Zahar, tinha uma peculiaridade: ele via tudo do alto, como se estivesse suspenso, flutuando. (...)” 

“Naquela madrugada na academia, porém, Zahar resolveu pôr à prova a tese de que realmente conseguia como tantas outras pessoas dizem conseguir sair do corpo, manter o estado de vigília e usar os sentidos para observar coisas concretas. Eu não deixo de ser, fora do corpo, aquele médico cartesiano que sou que quer comprovar as coisas. Pensei: tenho de fazer alguma coisa para provar a mim mesmo essa experiência. Então vi um parafuso esquecido no alto de uma máquina de exercício. Acordei e anotei, conta. No dia seguinte, foi até a máquina. Para ver o que havia em cima dela, precisou subir em um banco. Do chão, era impossível enxergar. Subi e vi o parafuso lá.” (Fonte: http://super.abril.com.br/cotidiano/projecao-astral-viagens-fora-corpo)

(III) “O contador paulista Fernando Augusto Golfar, de 37 anos, afirma que vive projeções desde os 6 anos. Contava a seus pais episódios vivenciados por parentes já mortos com os quais falava durante as experiências e visões de lugares que lembrava ter visto dias antes de visitá-los com a família. Por via das dúvidas, a mãe o levou algumas vezes a uma benzedeira. As experiências prosseguiram. Geralmente me vejo em locais de assistência, hospitais, áreas carentes, enterros ou ajudando usuários de drogas, conta. Assim como Borges, Golfar afirma ter desenvolvido sua mediunidade. Para ele, isso ajuda em suas projeções astrais, mas não é um requisito fundamental.” (Fonte: http://super.abril.com.br/cotidiano/projecao-astral-viagens-fora-corpo

Diante dos casos acima expostos, e para que se tenha uma melhor compreensão do fenômeno à luz do Espiritismo, vale ressaltar um dos pontos principais da doutrina, quando estabelece que o ser humano seja composto de três elementos: “(1º) O corpo ou ser material, semelhante ao dos animais e animado pelo mesmo princípio vital; 2º) A alma ou ser imaterial, espírito encarnado no corpo; 3º) O liame que une a alma ao corpo, princípio intermediário entre a matéria e o Espírito. (...) O liame ou perispírito que une o corpo e Espírito é uma espécie de invólucro semi material.” (Livro dos Espíritos - Introdução, VI)

Na realidade, o tema proposto é tratado inicialmente em O Livro dos Espíritos, primeira obra da codificação kardeciana e posteriormente em O Livro dos Médiuns, segundo livro codificado. Em O Livro dos Espíritos, dizem os Mestres espirituais que durante o sono, em razão do repouso orgânico os liames que unem o corpo ao Espírito se relaxam. Como o Espírito não acompanha a inatividade orgânica passa a dispor de mais faculdades que no estado de vigília. (LE, 401)

O fenômeno sonambúlico sob o efeito do sono é conceituado como “um estado de independência da alma, mais completo que no sonho, e então as faculdades adquirem maior desenvolvimento. A alma tem percepções que não atinge no sonho, que é um estado de sonambulismo imperfeito.” (LE, 425)

De acordo com as explanações iniciais, foi visto que a medicina cataloga o sonambulismo como uma doença na qual o sonâmbulo é alguém que por predisposição orgânica executa atividades durante o sono. A esse respeito, esclarecem os Mestres espirituais que o Espírito “preocupado com uma coisa ou outra, se entrega a alguma ação que exige o uso do seu corpo, do qual se serve como se empregasse uma mesa ou qualquer outro objeto material, nos fenômenos de manifestação física, ou mesmo de vossa mão, nas comunicações escritas.” (LE, 427) Ou seja, o Espírito utiliza-se do corpo físico como um instrumento para a realização de alguma atividade que deseje praticar. 

No que tange à clarividência sonambúlica, esta ocorre em razão da aptidão que tem o Espírito de atravessar livremente a matéria e não precisar dos órgãos físicos para ver e/ou ouvir além do plano físico. Dizem os Mestres que no estado de crise, o Espírito se lembra de conhecimentos adquiridos em existências anteriores, embora de forma incompleta, acrescentando que “passada a crise, toda a lembrança se apaga e ele volta à obscuridade.” (LE, p. 431)

Asseveram ainda que “o sonâmbulo possui mais conhecimentos do que lhe reconheceis,” só que adormecidos pelo corpo. Reiteradamente dizem que revivemos inúmeras vezes, e perdemos “materialmente o que conseguimos aprender na existência precedente. Entretanto no estado de crise, ele se lembra embora de maneira incompleta, pois não saberia dizer de onde vem o conhecimento, nem como o possui. Passada a crise, toda a lembrança se apaga e ele volta à obscuridade.” (LE, p. 431) Tais explicações ‘casam’ com o caso do artista plástico britânico Lee Hadwin, (I) que só consegue desenhar enquanto está dormindo.

Adiante prosseguem esclarecendo, que o desenvolvimento da clarividência sonambúlica depende das condições físicas (de acordo com a medicina) que permitem ao Espírito libertar-se de forma mais natural da matéria. A esse respeito, Kardec indaga se o sonâmbulo que vê à distância, vê do lugar em que está seu corpo ou daquele que está a sua alma, isto porque muito comumente o sonâmbulo experimenta no corpo sensações de calor ou de frio do lugar em que se encontra a sua alma, às vezes bem longe do corpo. (LE, p. 436)

Reiteram os Mestres espirituais que é a alma que se transporta e vê, mas como não deixou por completo o corpo, “permanece ligada a ele pelo laço que os une, e é esse laço que os une, o condutor das sensações” (perispírito). (O Livro dos Espíritos - pergunta 437)

Daí a experiência do médico Luiz Otávio Zahar (II) quando relatava que “as luzes da academia estavam apagadas e não havia ninguém usando os aparelhos de musculação nem circulando pelos corredores. O médico percorreu o espaço de um lado para o outro, sentindo-se absolutamente consciente. Mas seu passeio noturno, segundo Zahar, tinha uma peculiaridade: ele via tudo do alto, como se estivesse suspenso, flutuando”. Ou seja, o Espírito do médico libertou-se até a academia de ginástica, conferindo todo o ambiente do jeito em que estava fechada, com as luzes apagadas e totalmente deserta, em razão do horário (madrugada).

Em O Livro dos Médiuns o sonambulismo é tratado como uma variedade da faculdade mediúnica na qual, ocorrem duas ordens de fenômenos que freqüentemente se agregam. A ação do sonâmbulo quando está sob o domínio do próprio Espírito nos momentos de emancipação. Nesse caso, o que vê, ouve e percebe além dos limites dos sentidos, é oriundo dele mesmo (caso do desenhista e do médico).

Não obstante em outras circunstâncias, o sonâmbulo “serve de instrumento a outra inteligência. É passivo e o que diz não é dele. Em resumo; o sonâmbulo exprime o seu próprio pensamento e o médium exprime o pensamento do outro. Mas o Espírito que se comunica através de um médium comum pode fazê-lo por um sonâmbulo. Freqüentemente mesmo o estado de emancipação da alma, no estado sonambúlico, torna fácil essa comunicação.” (O Livro dos Médiuns - Cap. XIV, 172)

“Aqui aplicar-se-ia perfeitamente o relato do contador Fernando Augusto Golfar (III), quando afirma vivenciar o fenômeno sonambúlico (que denomina projeções) desde os 6 anos, quando contava aos pais episódios vivenciados por ‘parentes já mortos” com os quais falava durante as experiências e “visões de lugares que lembrava ter visto dias antes de visitá-los com a família“.

A Doutrina Espírita estabelece que a faculdade sonambúlica seja uma faculdade que depende do organismo e nada tem que ver com a elevação, o adiantamento e a condição moral do sujeito. Um sonâmbulo pode, pois, ser muito lúcido e incapaz de resolver certas questões, se o seu Espírito for pouco adiantado. (O Livro dos Médiuns - Cap. XIV, 174) 

Portanto, para o Espiritismo o fenômeno de “emancipação da alma”, pode ser ocasionado pelo sono, ou provocado magneticamente pelo "fluido vital, eletricidade animalizada que são modificações do fluido universal". (LE. 427) Tal fenômeno depende de uma condição orgânica do indivíduo que possibilita a liberação do Espírito, que se mantém ligado ao corpo físico pelo perispírito.

No que concerne às percepções do mesmo, poderão advir como lembranças confusas e incompletas, ou mesmo nenhuma lembrança. Segundo os Espíritos Superiores, “nos sonhos de que se tem consciência, os órgãos inclusive da memória, começam a despertar e recebem imperfeitamente as impressões produzidas pelos objetos ou as causas exteriores” (...). (LE, p. 425)

Para finalizar, pode-se concluir que o sonambulismo permite a clarividência quando o Espírito do sonâmbulo atravessa livremente os corpos opacos, podendo alcançar longas distâncias. Pode ser considerada como uma modalidade de mediunidade, quando o sonâmbulo em crise entra em contato com Espíritos, podendo vê-los e/ou ouvi-los. Para aqueles que pretendam uma melhor compreensão do assunto, exige-se obviamente um estudo aprofundado das Obras Fundamentais da Doutrina Espírita juntamente com a Revista Espírita.

domingo, 26 de agosto de 2012

"Área Q" e o misticismo das crianças índigo

Por Fabiano Vidal

Neste fim de semana tive a oportunidade de assistir ao filme “Área Q”, uma co-produção Brasil-Estados Unidos que contou com a presença do ator americano Isaiah Washington, da série de TV Gray’s Anatomy e dos brasileiros Murilo Rosa e Thânia Khalil.

A história gira em torno do jornalista norte-americano Thomas Matthews, que perde seu filho em circunstâncias não explicadas. Com o objetivo de ajudá-lo, seu chefe o envia para o Brasil com o objetivo de fazer uma reportagem sobre os misteriosos relatos de abdução por discos voadores no interior do Ceará.

O filme apresenta um enredo fraco e várias teorias místico-esotéricas que em nada possuem relação com a Doutrina Espírita como muitos acreditam e tampouco com o fenômeno ufológico. Por mais que se fale em OVNIS e abduções no filme, em nenhum momento o telespectador é apresentado a um deles. O que ganha destaque no filme é a fantasia sobre as crianças índigo, que seriam crianças nascidas a partir de 1987 com o DNA alterado, formando uma nova raça que irá habitar uma galáxia que está sendo criada a 12 bilhões de anos-luz da Terra.

Estranhamente, esse filme, que nada apresenta de Espiritismo, é divulgado por muitos como espírita, sem o ser. Uma prova cabal de que a Doutrina Espírita ainda é desconhecida em seus princípios por grande parte da população e da imprensa.

Quem espera aprender alguma coisa sobre a temática ufológica ou o Espiritismo, esqueça. Aprender sobre os dois assuntos é possível, mas através de bons livros de autores respeitados e críveis. No caso do Espiritismo, o estudo de Allan Kardec é fundamental para não sair acreditando em todas as bobagens apresentadas como espíritas.

No mais, “Área Q” só vale pelas belas tomadas do Ceará, um dos principais destinos turísticos do Nordeste.

Para saber mais:
Área Q – crítica do portal Omelete

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Materialização de Katie King – Fatos e Relatos


William Crookes
Por Ricardo Malta

A materialização é um fenômeno extraordinário pelo qual os Espíritos se apresentam, por assim dizer, corporificados.  “Podemos vê-los, tocá-los, fotografá-los, ouvi-los falar; em uma palavra, nos certificarmos por todos os meios possíveis de que, temporariamente, eles são tão vivos como os observadores.” (DELANNE, Gabriel. O fenômeno espírita: testemunho dos sábios.) Nada há de sobrenatural, tudo é regido pelas vias naturais.

“Na materialização mediúnica, apoiados nos recursos ectoplásmicos oriundos dos médiuns, dos assistentes, dos planos superiores, corporificam-se os Espíritos.” (Zalmino Zimmermann. Perispírito) Hernanni Guimarães Andrade critica o termo materialização, pois informa que o que ocorre de fato é uma ação modeladora do espírito sobre a matéria ectoplásmica.

Em certas sessões, na presença de médiuns dotados de considerável força psíquica, vêem-se formar mãos, rostos, bustos e mesmo corpos inteiros, que têm todas as aparências de vida: calor, tangibilidade, movimento. Essas mãos nos tocam, nos acariciam ou batem; mudam de lugar os objetos e fazem vibrar os instrumentos de música; esses rostos se animam e falam; esses corpos se movem e passeiam por entre os assistentes. Pode-se agarrá-los, palpá-los; depois, eles se desvanecem num repente , passando do estado sólido ao fluídico, após efêmera duração. (Leon Denis. No invisível)

Fenômeno incomum, mas rigorosamente demonstrado pelas pesquisas espiritistas.  Inúmeros foram os sábios (Gustave Geley, Charles Richet, Alexander Aksakof, Oliver Lodge, Russel Wallace, Ernesto Bozzano, etc.) que presenciaram esse fato mediúnico, contudo, foram as experiências e conclusões de Crookes que tiveram imensa repercussão na Inglaterra e na Europa, marcando um dos momentos mais importantes na história do Espiritismo. (Zalmino Zimmermann. Teoria da mediunidade.)

William Crooks relatou em sua obra “Fatos espíritas”, após três anos de profundas observações, a autenticidade das materializações do Espírito Katie King, operadas com o auxilio da jovem médium Florence Cook.

As pesquisas de Crooks não deixaram dúvidas com relação à existência de duas personalidades distintas, isto é, ficou demonstrado que não havia fraude, sendo que Florence Cook (médium) e Katie King (Espírito) eram individualidades totalmente independentes.

Florence Marryate, que acompanhava Crookes nas investigações, relata: 
Miss Cook é uma mocinha morena, de olhos e cabelos negros. Às vezes, Katie parecia-se muitíssimo com ela, mas em outras sessões a dissemelhança era palpável. [...] Vi muitas vezes miss Cook e Katie, uma ao lado da outra. Não tenho, pois, dúvida de que eram duas criaturas diferentes. W. Crookes também constatou o mesmo fato. (Florence Marryate. A Morte Não Existe) 

Katin King convidou o renomado pesquisador a entrar na cabine onde se encontrava a médium e, então, com o auxílio de uma lâmpada fosfórica, pôde ver, perfeitamente, o Espírito materializado ao lado da médium em transe, provando-se, assim, a existência de duas personalidades diferentes. (Zalmino Zimmermann. Teoria da Mediunidade)

Zalmino Zimmermann, em sua obra Teoria da Mediunidade, cita as importantes informações de Gabriel Delanne, que reproduzimos abaixo, in verbis:

Nela (Miss Cook) não há lugar para dúvidas. A médium é uma jovenzinha de 15 anos, incapaz de organizar e levar a bom termo tão colossal embuste, sob a meticulosa observação de jornalistas, escritores, e cientistas de primeira ordem. Tomaram-se todas as medidas, sempre com sua aquiescência, para impedir qualquer fraude. Procedeu-se em relação a ela como se teria feito com o mais hábil dos prestidigitadores. Imobilizam-se suas mãos por meio de cordas, cujos nós e laçadas são costurados e selados; com uma correia cinge-se sua cintura e fica sujeita às maiores precauções; as extremidades se fixam no solo mediante uma argola de ferro. Outras vezes passavam-lhe uma corrente elétrica pelo corpo de modo que um galvanômetro indicasse os seus menores movimentos. Entretanto, a aparição se mostrava completamente liberta, vestida com véus dispostos com arte e que desapareciam ao mesmo tempo em que o fantasma. Katie King difere tanto da médium Florence Cook que mesmo os incrédulos mais sistemáticos, como o Dr. Sexton, pôde vê-las juntas, enquanto Miss Cook jazia em transe, amarrada em sua cadeira. Seu testemunho confirma o da escritora Florence Marryat e o de Sir. William Crookes, que tinham podido ver a cena. (...) Mas o que demonstra peremptoriamente a independência absoluta de Katie King, é que ela fala com a médium estando completamente desperta. Pela leitura dos relatórios de Sir William Crooks vemos que, em sua última aparição, o Espírito se despediu de Miss Cook, quando esta foi despertada e posta em seu estado normal. 

Leon Denis, em sua obra “No Invisível”, traz-nos outro relato de Florence Marryat, in verbis:

Assisti diversas vezes às investigações feitas pelo Senhor Crookes, para se convencer da existência da aparição. Vi madeixas escuras de Florence Cook esparsas no chão, diante da cortina, à vista de todos os assistentes, enquanto Katie passeava e conversava conosco. Vi, em várias ocasiões, Florence e Katie, ao pé uma. da outra, de sorte que não posso ter a mínima dúvida de que eram duas individualidades distintas... No correr de uma sessão, pediu-se a Katie que se desmaterializasse em plena luz.

Consentiu em submeter-se à prova, embora nos dissesse em seguida que lhe havíamos feito muito mal. Foi encostar -se à parede do salão, com os braços estendidos em cruz. Acenderam -se três bicos de gás. O efeito produzido em Katie foi terrífico. Vimo-la ainda durante um segundo apenas; depois, ela desvaneceu-se lentamente. Não posso melhor comparar a sua extinção que a uma boneca de cera derretendo -se ao calor de um braseiro. Primeiramente, os dois lados do rosto, vaporizados e confusos, parecia entrarem um no outro; os olhos se afundavam nas órbitas; o nariz desapareceu e a fronte se desmanchou. Os membros e o vestido tiveram a mesma sorte; ia tudo caindo no tapete, como uma coisa que desmorona. A luz dos três bicos de gás olhávamos fixamente para o lugar que Katie King havia ocupado.

Zimermmann ainda lembra que Charles Darwin, depois de ler a obra de Crooks, aceitou um convite para participar de uma reunião:

Segundo o médico italiano Dr. Giulo Caratelli, Darwin, em carta à sua amiga Lady Derby, relata o ocorrido, declarando-se perplexo diante do que presenciou e que, embora sua formação “fortemente racional”, era levado a aceitar totalmente o “trabalho honesto e atento” de Crooks, amigo muito estimado e admirado.

Leon Denis lembra que os contraditores passaram a implantar a falsa informação de que Crooks houvera se retratado. W. Crookes, todavia, após 30 anos de publicação da sua obra, em congresso realizado em Briston, no ano de 1898, do qual ele era presidente, disse categoricamente:

Trinta anos se passaram, depois que publiquei as narrativas de experiências tendentes a demonstrar que, fora de nossos conhecimentos científicos, existe uma força posta em ação por uma inteligência que difere da inteligência comum a todos os mortais. Nada tenho que retratar; mantenho minhas observações já publicadas. Posso mesmo acrescentar -lhes outras muitas.

Note-se como agem os antagonistas! Já pensou se Crooks não tivesse a oportunidade de desmentir os boatos?

Nada obstante, os antagonistas continuam levantando objeções ridículas, primárias e risíveis. Mesmo após os testemunhos que atestam a distinção entre Miss Cook e Katie King, dizem que esta última nunca existiu e que era a médium disfarçada. Tal conclusão origina-se da semelhança que muitas vezes existia entre as duas. Bem se vê que falta conhecimento do Espiritismo para muitos críticos!

A semelhança que existia decorre do fenômeno conhecido como materialização conjugada: “Por apoiar-se o manifestante no perispírito do próprio médium, ou ser por ele estreitamente influenciado, (...) a aparência do Espírito materializado parece, muitas vezes, apresentar semelhanças com a do médium. Esse tipo de manifestação surge em determinadas circunstâncias ou condições, sabendo-se, entretanto, que o médium pode servir-se aos dois tipos de materialização.” (Zalmino Zimmermann. Perispírito) Todavia, cumpre registrar que, conforme informam os relatos, nem sempre havia semelhança entre a médium e o Espírito.

Devemos destacar um fato notável envolvendo a sociedade dialética de Londres:

Em 1869, a Sociedade Dialética de Londres, uma das mais autorizadas agremiações científicas, nomeou uma Comissão de trinta e três membros, sábios, literatos, prelados, magistrados, entre os quais Sir John Lubbock, da Royal Society, Henry Lewes, hábil fisiologista, Huxler, Wallace, Crookes, etc., para examinar e “aniquilar para sempre” esses fenômenos espíritas, que, dizia a moção, “são somente produto da imaginação”. Depois de dezoito meses de experiências e de estudos, a Comissão, em seu relatório, reconheceu a realidade dos fenômenos e concluiu em favor do Espiritismo.(Leon Denis. Depois da morte)

Pelo exposto, não foi sem motivos que Charles Richet disse:

As experiências de Crookes são de granito e nenhuma crítica prevalece contra elas. Aconselho a lerem com cuidado os relatos de Crookes e hão de se convencer da realidade dos fatos, a menos que se resignem a tratar Crookes de imbecil, o que seria uma imbecilidade.

Eis mais um dos fatos espíritas. William Crookes, assim como Tomé, tocou o fenômeno com os dedos.


O que deve ser a história do Espiritismo


Por Allan Kardec

A propósito dessa história, sobre a qual dissemos algumas palavras, várias pessoas nos perguntaram o que compreenderia ela e, a propósito, nos enviaram diversos relatos de manifestações. Aos que pensaram assim trazer uma pedra ao edifício, agradecemos a intenção, mas diremos que se trata de algo mais sério que um catálogo de fenômenos espíritas, encontradiço em muitas obras.

Tendo que se destacar o Espiritismo nos fastos da humanidade, será interessante para as gerações futuras saber porque meios ter-se-á ele se estabelecido. Será, pois, a história das peripécias que tiverem assinalado os seus primeiros passos; das lutas que tiver enfrentado; dos entraves que lhe terão oposto; de sua marcha progressiva no mundo inteiro.

O verdadeiro mérito é modesto e não busca fazer-se valer.

É preciso que a humanidade conheça os nomes dos primeiros pioneiros da obra, daqueles cuja abnegação e devotamento merecerão ser inscritos em seus anais; das cidades que marcharam na vanguarda; dos que sofreram pela causa, a fim de que os abençoem; e dos que fizeram sofrer, a fim de que orem, para que sejam perdoados; numa palavra, de seus amigos dedicados e de seus inimigos confessos ou ocultos.

É preciso que a intriga e a ambição não usurpem o lugar que lhes pertence, nem um reconhecimento e uma honra que lhes não são devidos. Se há Judas, devem ser desmascarados. Uma parte que não será menos importante é a das revelações que, seguidamente, anunciaram todas as fases dessa nova era e os acontecimentos de toda a ordem, que as acompanharam.

Aos que achassem a tarefa presunçosa, diremos que não temos outro mérito senão o de possuir, por nossa posição excepcional, documentos que não pertencem a ninguém e que estão ao abrigo de quaisquer eventualidades; que, incontestavelmente, estando o Espiritismo sendo chamado a desempenhar um grande papel na História, importa que seu papel não seja desnaturado, e opor uma história autêntica às histórias apócrifas que o interesse pessoal poderia fabricar.

Quando aparecerá ela?

Não será tão cedo e talvez não em nossa encarnação, pois não se destina a satisfazer a curiosidade do momento. Se dela falamos por antecipação, é para que ninguém se equivoque quanto ao seu objetivo e seja anotada a nossa intenção. Aliás, o Espiritismo está em começo e muitas outras coisas terão passado até lá. Então, é preciso esperar que cada um tenha tomado o seu lugar, certo ou errado.

Fonte: Revista Espírita – ANO V, outubro de 1862

A degeneração do Espiritismo

Dalmo Duque dos Santos

Por Dalmo Duque dos Santos

Comparando a história do Espiritismo com a do Cristianismo Primitivo, podemos tirar algumas conclusões importantes para a o futuro da nossa doutrina e o do seu movimento social.

O Cristianismo, cuja pureza doutrinária do Evangelho e simplicidade de organização funcional dos primeiros núcleos cristãos foi conquistando lenta e seguramente a sociedade de sua época, sofreu com o tempo um desgaste ideológico. Corrompeu-se por força dos interesses políticos, financeiros e institucionais. Os novos adeptos e seus líderes, não conseguindo penetrar na essência do Evangelho, que é regeneração, ou seja, o mergulho doloroso no mundo interior e a reversão das atitudes exteriores, adaptaram o mesmo às suas conveniências psico-sociais, atacando suas idéias mais contundentes à moral animalizada, alimentando os mecanismos de defesa da mente, fazendo concessões às fraquezas dos adeptos e desviando-os para o comodismo dos disfarces rituais exteriores. Repressão de forças espirituais espontâneas e idéias consideradas ameaçadoras ao clero, como a mediunidade e a reencarnação; a falsificação de tradições e a adoção do sincretismo do costumes bárbaros, foram as principais estratégias dessa clericalização do cristianismo.

O resultado de tudo isso é bem conhecido: dois milênios de intolerâncias, violências, atraso espiritual, perpetuação das injustiças sociais, agravamento de compromissos com a lei de ação e reação e forte comprometimento da regeneração do nosso planeta.

Com o Espiritismo não está sendo muito diferente.

Apesar das advertências dos Espíritos e do próprio Allan Kardec quanto aos períodos históricos e tendências do movimento, os espíritas insistem em cometer os mesmos erros do passado. Os mesmos erros porque provavelmente somos as mesmas almas que rejeitaram e desviaram o Cristianismo da sua vocação e agora posamos de puristas ortodoxos, inimigos ocultos do Espírito da Verdade.

Negligentes com a oração e a vigilância, cedemos constantemente aos tentáculos do poder e da vaidade. Desprezamos a toda hora a idéia do “amai-vos e instruí-vos”, entendendo-a egoisticamente, ora como fortalecimento intelectual competitivo, ora como o afrouxamento dos valores doutrinários. Não conseguindo nos adaptar ao Espiritismo, compreendendo e vivenciando suas verdades, vamos aos poucos adaptando a doutrina aos nosso limites, corrompendo os textos da codificação, ignorando a experiência histórica de Allan Kardec e dos seus colaboradores, trazendo para os centros espíritas práticas dogmáticas das nossas preferências religiosas, hábitos políticos das agremiações que freqüentamos e mais comumente a interferência negativas dos nossos caprichos e vaidades pessoais.

Como os primeiros cristãos, também lutamos pelo crescimento de nossas instituições, deixando-nos seduzir pelo mundo exterior e imitando os grupos já pervertidos, construindo palácios arquitetônicos, cuja finalidade sempre foi causar impressão aos olhos e a falsa idéia de prestígio político; e dentro deles praticamos as mesmas façanhas da deslealdade, das rivalidades, das perseguições aos desafetos, da auto-afirmação e liderança autoritária, de crítica e boicote às idéias que não concordamos.

E, finalmente, cultivamos uma equívoca concepção de unificação, esperando ingenuamente que a nossas idéias e grupos sejam majoritários num Grande Órgão Dirigente do Espiritismo Mundial, do nosso imaginário, e muitas outras tolices e fantasias que nem vale a pena enumerar aqui.

E assim caminhamos, unidos em nossas displicências e divididos nas responsabilidades. Preferimos esquecer figuras exemplares que atuaram na Sociedade Espírita de Paris quando ignoramos nossa história sabiamente registrada na Revista Espírita. Deixamos de lado líderes agregadores – ainda que divergências normais e toleráveis existissem entre eles – para ouvir e nos deixar dominar por um disfarçado clero institucional, comando por vozes medíocres e ciumentas, figueiras estéreis, sofistas encantadores e improdutivos, enfim, velhas almas e velhas tendências, vinho azedo e frutas podres em nossos mais caros celeiros doutrinários.

Mas como evitar esse processo de corrupção e, em alguns casos notórios, de contaminação e má conduta? Como reverter a situação para reconduzir essas experiências para os rumos verdadeiramente espíritas? O que fazer com as más instituições, com os maus dirigentes, os maus médiuns, maus comunicadores, enfim os maus espíritas? Devemos identificá-los e expulsá-los dos nossos quadros? Devemos denunciá-los e discriminá-los como fazia a Inquisição com os acusados de heresia?

O que fazer com os livros que consideramos impuros ou inconvenientes ao movimento?: devemos queimá-los em praça pública, censurá-los em nossas bibliotecas ou então deixar que a própria comunidade espírita pratique o livre arbítrio e aprenda a fazer escolhas corretas e adequadas às suas necessidades?

O Espiritismo foi certamente uma doutrina elaborada por Espíritos Superiores e isto nos deixa tranqüilos quanto ao seu futuro doutrinário. Mas o seu movimento vem sendo feito por seres humanos, espíritos ainda imaturos e inexperientes. Isso realmente tem nos deixado muito preocupados, pois sabemos que, hoje, os inimigos do Espiritismo estão entre os próprios espíritas.

Fonte: Portal do Espírito - http://www.espirito.org.br/portal/artigos/dalmo/a-degeneracao.html

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Herculano Pires e Ramatis


Do blog "Pureza Doutrinária Espírita"

Postagem de Artur Felipe Azevedo

Começaremos com J. Herculano Pires(1914-1979), jornalista, filósofo, poeta, tradutor e pensador espírita paulista.

É considerado o maior pensador espírita do Brasil e um dos maiores intérpretes do pensamento kardeciano.

Chamado de “O Guarda Noturno do Espiritismo”, foi um dos grandes defensores do caráter cultural e filosófico do Espiritismo, tendo travado memoráveis polêmicas com detratores da Doutrina Espírita.

Fundador da União Social Espírita (atual USE), entusiasta da educação espírita, Herculano escreveu mais de 80 obras sobre inúmeros temas. Foi presidente do Sindicato Estadual dos Jornalistas de São Paulo.

Obras: O Reino; Espiritismo Dialético; O Mistério do Ser Ante a Dor e a Morte; O Espírito e o Tempo; Revisão do Cristianismo; Agonia das Religiões; O Centro Espírita; Curso Dinâmico de Espiritismo; Mediunidade; Ciência Espírita e suas Implicações Terapêuticas; Pesquisa Sobre o Amor.

Vamos, agora, aos seus comentários críticos sobre Ramatis e quejandos:

“Faz-se, em geral, muita confusão a propósito de Espiritismo. Há confusões intencionais, promovidas por elementos interessados em combater a propagação inevitável da Doutrina, e há confusões inocentes, feitas por pessoas de reduzido conhecimento doutrinário. As primeiras, as intencionais, não seriam funestas, porque facilmente identificáveis quanto ao seu objetivo, se não houvesse confusões inocentes, que preparam o terreno para aquelas explorações.

Os Centros Espíritas têm um grande papel a desempenhar na luta pelo esclarecimento do povo, devendo promover constantes programas de combate a todas as formas de confusão doutrinária. Por isso mesmo, devem ser dirigidos por pessoas que conheçam a Doutrina, que a estudem incessantemente e que não se deixem levar por sugestões estranhas. Quando os dirigentes de Centro não se sentirem bastante informados dos princípios doutrinários, devem revestir-se, pelo menos, da humildade suficiente para recorrerem aos conselhos de pessoas mais esclarecidas e à leitura de textos orientadores.

Há um pequeno livro de Kardec que muitos dirigentes desprezam, limitando-se a aconselhar a sua leitura aos leigos e principiantes: exatamente “O Principiante Espírita”. Esse livrinho é precioso orientador doutrinário, que os dirigentes devem ler sempre. Outro pequeno volume aconselhável é “O Que É o Espiritismo”, também de Kardec. Principalmente agora, nesta época de confusões que estamos atravessando, os dirigentes de Centros, Grupos Familiares e demais organizações doutrinárias, deviam ter esses livros como leitura diária, obrigatória.

Além das confusões habituais entre Umbanda e Espiritismo, Esoterismo, Teosofia, Ocultismo e Espiritismo, há outras formas de confusão que vêm sendo amplamente espalhadas no meio espírita. São as confusões de origem mediúnica, oriundas de comunicações de espíritos que se apresentam como grandes instrutores, dando sempre respostas e informações sobre todas as questões que lhes forem propostas. Um exemplo marcante é o de Ramatis, cujas mensagens vêm sendo fartamente distribuídas.

Qualquer estudioso da Doutrina percebe logo que se trata de um espírito pseudo-sábio, segundo a “escala espírita” de Kardec. Não obstante, suas mensagens estão assumindo o papel de sucedâneos das obras doutrinárias, levando até mesmo oradores espíritas a fazerem afirmações ridículas em suas palestras, com evidente prejuízo para o bom conceito do movimento espírita.

Não é de hoje que existem mensagens dessa espécie. Desde todos os tempos, espíritos mistificadores, os falsos profetas da erraticidade, como dizia Kardec, e espíritos pseudo-sábios, que se julgam grandes missionários, trabalham, consciente ou inconscientemente, na ingrata tarefa de ridicularizar o Espiritismo. Mas a responsabilidade dos que aceitam e divulgam essas mensagens não é menor do que a dos espíritos que as transmitem.

Por isso mesmo, é necessário que os confrades esclarecidos não cruzem os braços diante dessas ondas de perturbação, procurando abrir os olhos dos que facilmente se deixam levar por elas.

O Espiritismo é uma doutrina de bom senso, de equilíbrio, de esclarecimento positivo dos problemas espirituais, e não de hipóteses sem base ou de suposições imaginosas. As linhas seguras da Doutrina estão na Codificação Kardeciana.

Não devemos nos esquecer de que a Codificação representa o cumprimento da promessa evangélica do Consolador, que veio na hora precisa.

Deixar de lado a Codificação, para aceitar novidades confusas, é simples temeridade. Tanto mais quando essas novidades, como no caso de Ramatis, são mais velhas do que a própria Codificação.”

Herculano e as bases para um pleno entendimento doutrinário

“O estudo e os debates devem cingir-se às obras da Codificação. Substituir as obras fundamentais por outras, psicografadas ou não, é um inconveniente que se deve evitar. Seria o mesmo que, num curso de especialização em Pedagogia, passar-se a ler e discutir assuntos de Mecânica, a pretexto de variar os temas. O aprendizado doutrinário requer unidade e seqüência, para que se possa alcançar uma visão global da Doutrina. Todas as obras de Kardec devem constar desses trabalhos, desde os livros iniciáticos, passando pela Codificação propriamente dita, até os volumes da Revista Espírita.

Precisamos nos convencer desta realidade que nem todos alcançam: Espiritismo é Kardec. Porque foi ele o estruturador da Doutrina, permanentemente assistido pelo Espírito da Verdade. Todos os demais livros espíritas, mediúnicos ou não, são subsidiários. Estudar, por exemplo uma obra de Emmanuel ou André Luiz sem relacioná-la com as obras de Kardec, a pretexto de que esses autores espirituais superam o Mestre (cujas obras ainda não conhecemos suficientemente) é demostrar falta de compreensão do sentido e da natureza da Doutrina. Esses e outros autores respeitáveis dão sua contribuição para a nossa maior compreensão de Kardec, não podem substituí-lo. É bom lembrar a regra do “consenso Universal”, segundo o qual nenhum espírito ou criatura humana dispõem, sozinhos, por si mesmos, de recursos e conhecimentos para nos fazerem revelações pessoais. Esse tipo de revelações individuais pertence ao passado, aos tempos anteriores ao advento da Doutrina. Um novo ensinamento, a revelação de uma “verdade nova” depende das exigência doutrinária de:

a) Concordância universal de manifestações a respeito;

b) Concordância da questão com os princípios básicos da Doutrina:

c) Concordância com os princípios culturais do estágio de conhecimento atingido pelo nosso mundo;

d) Concordância com os princípios racionais, lógicos e logísticos do nosso tempo.

Fora desse quadro de concordâncias necessárias, que constituem o “consenso Universal”, nada pode ser aceito como válido. Opiniões pessoais, sejam de sábios terrenos ou do mundo espiritual, nada valem para a Doutrina. O mesmo ocorre nas Ciências e em todos os ramos do Conhecimento na Terra. Porque o Conhecimento é uma estrutura orgânica, derivada da estrutura exterior da realidade e nunca sujeita a caprichos individuais.

Por isso é temeridade aceitar-se e propagar-se princípios deste espírito ou daquele homem como se fossem elementos doutrinários. Quem se arrisca a isso revela falta de senso e falta absoluta de critério lógico, além de falta de convicção doutrinária. O Espiritismo não é uma doutrina fechada ou estática, mas aberta ao futuro. Não obstante, essa abertura está necessariamente condicionada as regras de equilíbrio e de ordem que sustentam a verdade e a eficácia da sua estrutura doutrinária.

Como a Química, a Física, a Biologia e as demais Ciências, o Espiritismo não é imutável, está sujeito às mudanças que devem ocorrer com o avanço do conhecimento espírita. Mas como em todas as Ciências, esse avanço está naturalmente subordinado às exigências do critério racional, da comprovação objetiva por métodos científicos e do respeito ao que podemos chamar de “natureza da doutrina”.

Introduzir na doutrina práticas provenientes de correntes espiritualistas anteriores a ela seria o mesmo que introduzir na Química as superadas práticas da Alquimia. As Ciências são organismos conceptuais da cultura humana, caracterizados pela sua estrutura própria e pelas leis naturais do seu crescimento, como ocorre com os organismo biológicos.

Todos nós ainda trazemos a “herança empírica” do passado anterior ao desenvolvimento da cultura científica, e somos às vezes tentados a realizar façanhas cientificas para as quais não estamos aptos. E como todos somos naturalmente vaidosos, facilmente nos entusiasmamos com a suposta possibilidade de nos tornarmos renovadores doutrinários. Nascem daí as mistificações como a de Roustaing, tristemente ridícula, a que muitas pessoas se apegam emocionalmente, o que as torna fanáticas e incapazes de perceber os enormes absurdos nelas contidos. Até mesmo pessoas cultas, respeitáveis, deixam-se levar por essas mistificações, por falta de humildade intelectual e de critérios científicos. Espíritos opiniáticos ou sectários de religiões obscurantistas aproveitam-se disso para introduzir essas mistificações em organizações doutrinárias prestigiosas, com a finalidade de ridicularizar o Espiritismo e afastar dele as pessoas sensatas que sabem subordinar a emoção à razão e que muito poderiam contribuir para o verdadeiro desenvolvimento da doutrina.

Por tudo isso, as manifestações mediúnicas em sessões doutrinárias devem ser recebidas sempre com espírito crítico. Aceitá-las como verdades reveladas é abrir as portas à mistificação, à destruição da própria finalidade dessas sessões. Também por isso, o dirigente dessas sessões deve ser uma pessoa de espírito arejado, racional, objetivo, capaz de conduzir os trabalhos com segurança. Kardec é sempre a pedra de toque para verificação das supostas revelações que ocorrem. O pensamento espírita é sempre racional, avesso ao misticismo. Os espíritos comunicantes, em geral, são de nível cultural mais ou menos semelhantes ao das pessoas presentes. Não devem ser encarados como seres sobrenaturais pois não passam de criaturas humanas desencarnadas, na maioria apegadas aos seus preconceitos terrenos, a morte não promove ninguém a sábio nem confere aos espíritos autoridade alguma em matéria de doutrina. Por outro lado, os espíritos realmente superiores só se manifestam dentro das condições culturais do grupo, não tendo nenhum interesse em destacar-se como geniais antecipadores de descobertas cientificas que cabe aos encarnados e não a eles fazerem. A idéia do sobrenatural, nas relações mediúnicas, é a fonte principal das mistificações.

Homens e espíritos vaidosos se conjugam nas tentativas pretensiosas de superação doutrinária. Se não temos ainda, no mundo inteiro, instituições espíritas à altura da doutrina, isso se deve principalmente à vaidade e à invigilância dos homens e espíritos que se julgam mais do que são. Nesta hora de muitas novidades, é bom verificarmos que as maiores delas já foram antecipadas pelo Espiritismo. É ele, o Espiritismo, a maior novidade dos novos tempos. Se tomarmos consciência disso, evitaremos os absurdos que hoje infestam o meio doutrinário e facilitaremos o desenvolvimento real da doutrina em bases racionais.”

Atualidade das Recomendações de José Herculano Pires


Por Tadeu Saboia

Diante de tantas incoerências dentro do movimento espírita brasileiro com relação ao Espiritismo sério, José Herculano Pires, há mais de 30 anos, já nos advertia e previa essa bagunça doutrinária que infelizmente vemos hoje. E em sua visão de filósofo e estudioso do Espiritismo, dava-nos a solução para o problema: Estudar sistematicamente e compreender as obras de Allan Kardec abandonando esse Pseudo-Espiritismo fanático-mediúnico, adorador de médiuns, igrejeiro e católico que se instalou como uma praga no falido movimento Espírita Brasileiro.

Vejamos um trecho do Livro Curso Dinâmico de Espiritismo, em seu capítulo 17: Ação Espírita na Transformação do Mundo.

“As relações humanas se baseiam na afetividade humana. Não há afetos entre corações insensíveis. Por isso a dor campeia no mundo, pois só ela pode abalar os corações de pedra. Mas o Espiritismo nos mostra que o coração de pedra é duro por falta de compreensão da realidade, de tradições negativas que o homem desenvolveu em tempos selvagens e brutais. Essas relações se modificam quando oferecemos aos homens uma visão mais humana e mais lógica da Realidade universal. Essa visão não tem sido apresentada pelos espíritas que, na sua maioria, se deixam levar apenas pelo aspecto religioso da doutrina, assim mesmo deformado pela influência de formações religiosas anteriores. Precisamos restabelecer a visão espírita em sua inteireza, afastando os resíduos de um passado de ilusões e mentiras prejudiciais. Se compreenderem a necessidade urgente de se aprofundarem no conhecimento da doutrina, de maneira a fornecerem uma sólida e esclarecida doutrina espírita, poderão realmente contribuir para a modificação do mundo em que vivemos. Gerações e gerações de espíritas passaram pela Terra, de Kardec até hoje, sem terem obtido sequer um laivo de educação espírita, de formação doutrinária sistemática. Aprenderam apenas alguns hábitos espíritas, ouviram aulas inócuas de catecismo igrejeiro, tornaram-se, às vezes, ardorosos na adolescência e na juventude (porque o Espiritismo é oposição a tudo quanto de envelhecido e caduco existe no mundo), mas ao se defrontarem com a cultura universitária incluíram a doutrina no rol das coisas peremptas por não terem a menor visão da sua grandeza. Pais ignorantes e filhos ignorantes, na sucessão das encarnações inúteis, nada mais fizeram do que transformar a grande doutrina numa seita de papalvos (Parvo, pateta, boboca. Indivíduo que se deixa enganar facilmente.). Duras são e têm de ser as palavras, porque ineptas e criminosas foram as ações condenadas. A preguiça mental de ler e pensar, a pretensão de saber tudo por intuição, de receber dos guias a verdade feita, o brilhar inútil e vaidoso dos tribunos, as mistificações aceitas de mão beijada como bênçãos divinas e assim por diante, num rol infindável de tolices e burrices fizeram do movimento doutrinário um charco de crendices que impediu a volta prevista de Kardec para continuar seu trabalho. Em compensação, surgiram os reformadores e adulterados, as mistificações deslumbrantes e vazias e até mesmo as séries ridículas de reencarnações do mestre por contraditores incultos de suas mais valiosas afirmações doutrinárias.”  (José Herculano Pires) (cores e negritos meus)
                                                                                       
Quem tem olhos para ver, veja!  Meu Deus!  É um retrato trágico e verídico do que se observa nos dias de hoje!  Só um espírito superior da equipe de Kardec poderia escrever uma verdade tão simples, dura e necessária sobre o movimento espirita brasileiro. Espero que todos nós possamos ter a humildade de vestir a carapuça, se for o caso, e mudar de atitude perante o Espiritismo.

Fico feliz de saber que se Herculano Pires escrevesse esse artigo aqui, nesse site, seria alvo de muitos dos fanáticos-igrejeiros que diriam que ele está sendo incompreensível, obsidiado, sem caridade, que gosta de polemizar, que adora fazer confusão, que esse tipo de comentário não agrega valor, que o espiritismo não precisa disso, que essas questões são acessórias, que o que importa é o amor e não as críticas, que é muito duro, que esta sendo injusto com os santos médiuns e famosos palestrantes, que o espírita não pode ser tão crítico, que deveria aceitar as novas revelações e todo o “blábláblá” que vez por outra encontramos por ai.

Fiquem todos com Deus e até a próxima.

Publicado no site kardeconline.ning.com

Roustaing procura o Codificador


Por Nazareno Tourinho

Entre Jean-Baptiste Roustaing e Allan Kardec só existiu ligação de caráter meramente epistolar, e assim mesmo porque o primeiro se interessou em escrever para o segundo. Os dois nunca estiveram juntos, trocando um cumprimento face a face. Não há notícia de que Roustaing tenha alguma vez visitado a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, onde atuava o Codificador, nem registro de seu comparecimento às homenagens prestadas pelos espíritas de Bordeaux ao mestre de Lyon, quando ele lá esteve, inclusive ouvindo uma alocução do médico Bouché de Vitray na qual foi citado o nome do famoso bastonário, nascido e residente na cidade.

O contato inicial, via Correio, de Roustaing com Kardec, figura na edição de junho de 1861 da Revista Espírita.

A essa altura O Livro dos Espíritos já fazia sucesso há mais de quatro anos e o advogado da Corte Imperial de Bordeaux começara a se envolver com fenômenos mediúnicos há menos de seis meses.

Estava deslumbrado com a Doutrina.

Trata o seu codificador respeitosamente, chamando-o de “muito honrado chefe espírita”.

Pelo teor da missiva constata-se que se dirigira ao honrado chefe antes e fora orientado no sentido de se aproximar do Sr. Sabô, um destacado espírita em sua terra natal.

Na longa carta, que toma quatro páginas da Revista Espírita, Roustaing se refere “a reencarnação como único meio de ver o reino de Deus”. Depois, consoante não ignora mais o leitor, subscreveria a tese de que a encarnação, e consequentemente a reencarnação, jamais foram necessários (único meio) para a conquista do “reino de Deus”, não passando de um castigo para punir este ou aquele Espírito rebelde, espécie de anjo decaído na versão da teologia católica.

Termina Roustaing declarando que somente não vai a Paris ao encontro de Kardec porque a isso se opõe a sua saúde.

Diante de tão efusivo testemunho de apreço individual e solidariedade ideológica, o Codificador do Espiritismo, em termos amáveis, manifesta simpatia pelo futuro desertor da causa em que se empenhava devotadamente.

Cinco meses depois, relatando na Revista Espírita de novembro de 1861 uma visita recente feita a Bordeaux, Kardec informa ter o movimento espírita local homens de “eminente posição”, e “muitos bons médiuns”, contudo não menciona o nome de Roustaing nem o da sua psicografa, Emilie Collignon, que também residia na cidade.

Conforme se vê, Roustaing não privou da intimidade de Kardec, não conviveu com ele, não desfrutou sequer de sua atenção, salvo quando o incomodou com escritos suspeitosos. É falso, pois, o companheirismo entre ambos, insinuado por alguns rustenistas. Quanto à Emilie Collignon, o que a Coleção da Revista Espírita nos sugere é a preferência do mestre de Lyon por outro médium de Bordeaux, a Sra. Cazemajoux. Em maio de 1861 o Codificador divulga duas mensagens recebidas por esta médium. Em agosto do mesmo ano, mais uma, com assinatura espiritual de Byron. Em fevereiro do ano seguinte, 1862, novas mensagens da Sra. Cazemajoux. Só então é que um escrito de Emilie Collignon, aliás não mediúnico, aparece pela primeira vez na Revista Espírita, publicada por Allan Kardec. E aparece de um modo que, sob o aspecto doutrinário, não a recomenda bem.

Veremos esta particularidade no próximo texto.

Fonte:
TOURINHO, Nazareno.  As Tolices e Pieguices da Obra de Roustaing – Nazareno Tourinho; ensaio crítico-doutrinário; 1ª edição, Edições Correio Fraterno, São Bernardo do Campo, SP, 1999.