quinta-feira, 20 de maio de 2010

O desaparecimento do corpo de Jesus

Por Allan Kardec

O desaparecimento do corpo de Jesus após sua morte foi objeto de numerosos comentários; é atestado pelos quatro evangelistas, que se basearam em relatos das mulheres que se apresentaram no sepulcro no terceiro dia, e que não o acharam. Uns viram nesse desaparecimento um fato milagroso; outros supuseram uma remoção clandestina. Segundo outra opinião, Jesus não teria jamais revestido um corpo carnal, mas somente um corpo fluídico (Ver “Os Quatro Evangelhos” de J.B. Roustaing), ou seja, durante toda sua vida, não teria sido senão uma aparição tangível, uma espécie de agênere. Seu nascimento, sua morte, e todos os atos materiais de sua vida não teriam sido mais do que uma aparição. E dizem que só assim se explica que seu corpo, retornado ao estado fluídico, pôde desaparecer do sepulcro, e foi com esse mesmo corpo que ele teria se mostrado depois de sua morte. Sem dúvida, um fato dessa natureza não é radicalmente impossível, segundo o que se sabe hoje sobre as propriedades dos fluídos; seria, porém, pelo menos, inteiramente excepcional e estaria em oposição formal com o caráter dos agêneres que jamais demoram por muito tempo e não podem tornar-se comensais habituais de uma casa, nem figurar entre os membros de uma família.

Na verdade, a permanência de Jesus sobre a Terra apresenta dois períodos bem distintos: aquele que precede e aquele sucede à sua morte. No primeiro período, desde o momento da concepção até o seu nascimento, tudo se passou com sua mãe como nas condições comuns da vida humana. (Portanto, Maria, como esposa de José, teve relações sexuais com ele e ficou grávida durante nove meses, findos os quais, num parto natural, deu à luz um belo menino, cumprindo assim a Lei divina que diz: ‘- Crescei e multiplicai-vos’). A partir do nascimento, e até sua morte, tudo em seus atos, em sua linguagem, e nas diversas circunstâncias de sua vida, apresenta os caracteres inequívocos da sua corporeidade. Os fenômenos de ordem psíquica que se produzem nele são acidentais e nada têm de anormal, pois explicam-se pelas propriedades do perispírito, e são encontrados em diferentes graus em outros indivíduos. Depois de sua morte, ao contrário, tudo revela nele o ser fluídico...

Depois do suplício, o corpo de Jesus lá ficou, inerte e sem vida; foi sepultado como os corpos comuns o são também, e todos puderam vê-lo e tocá-lo...

É forçoso, pois concluir que, se Jesus pôde morrer, é porque tinha um corpo carnal, como todos nós.

Entretanto, aos fatos materiais se juntam considerações morais do mais alto poder.

Se, durante sua vida, Jesus tivesse estado sempre nas condições dos seres fluídicos, não teria experimentado nem a dor, nem nenhuma das necessidades do corpo; supor que ele assim era (fluídico), é o mesmo que retirar-lhe todo o mérito da vida de privações e de sofrimentos que, antes de reencarnar, havia escolhido como exemplo de resignação. E depois, se tudo nele era só aparência, todos os atos de sua vida, o anúncio reiterado de sua morte, a cena dolorosa do Jardim das Oliveiras, sua oração a Deus para que afastasse o cálice de seus lábios, sua paixão, sua agonia, tudo enfim, até mesmo seu último grito no momento de entregar o Espírito, não teria sido senão um vão simulacro, para enganar com relação à sua natureza e fazer crer no sacrifício ilusório de sua vida, o que seria uma comédia indigna de um homem honesto e simples, quando mais, e por mais forte razão ainda, de um ser também superior, como era ele, Jesus. Numa palavra, Jesus teria abusado da boa fé dos seus contemporâneos e da posteridade. Tais são as conseqüências lógicas desse sistema (o docetismo antigo e o roustainguismo moderno), conseqüências que não são admissíveis, pois teriam como resultado diminuí-lo moralmente ao invés de exaltá-lo.

Jesus teve, portanto, como todos nós, humanos, um corpo carnal e um corpo fluídico, o que é confirmado pelos fenômenos materiais e pelos fenômenos psíquicos que assinalaram sua vida”

Ver “A Gênese - Os Milagres e as predições segundo o Espiritismo”, caps. XIV nº 36 e XV, nº 64, 65 e 66.

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